Modulação de efeitos: Terceira Turma do STJ reconhece direito à indenização securitária em caso de suicídio ocorrido antes do decurso do prazo de dois anos da contratação
No julgamento do REsp 1.721.716, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, deu provimento ao recurso de uma viúva para determinar à Itaú Seguros S/A o pagamento de seguro de vida contratado pelo marido da recorrente, que cometeu suicídio antes de decorridos dois anos da contratação, aplicando entendimento vigente à época dos fatos.
O recurso teve origem em ação ajuizada pela viúva, em 2012, para pleitear a indenização após a negativa de pagamento pela seguradora, a qual invocou o art. 798 do Código Civil, segundo o qual ” o beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observado o disposto no parágrafo único do artigo antecedente.”
Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente, com base no entendimento então vigente no STJ (Súmula 61), que refletia a posição do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a matéria (Súmula 105). A jurisprudência era no sentido de que o fato de o suicídio ter ocorrido nos dois primeiros anos do contrato de seguro, por si só, não eximia a seguradora do dever de indenizar, sendo necessária a comprovação inequívoca de que o segurado suicida contratou o seguro de forma premeditada.
Contudo, em 2015, o STJ mudou de posição e passou a entender que o suicídio não é coberto pelo seguro se ocorre nos dois anos iniciais do contrato – como estabelece literalmente o artigo 798 – entendimento esse que deu origem à Súmula 610, editada em 2018 pela Segunda Seção. Com isso, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) deu provimento à apelação interposta pela seguradora.
A viúva então recorreu ao STJ pedindo que fosse aplicado ao seu caso o entendimento anterior, uma vez que os fatos e a sentença antecederam a mudança jurisprudencial. O seu pedido foi fundamentado na doutrina da superação prospectiva da jurisprudência, também chamada de modulação dos efeitos.
Em seu voto, a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, explicou que essa teoria é invocada nas hipóteses em que há alteração da jurisprudência consolidada dos tribunais e tem fundamento no artigo 927, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil que prevê a possibilidade de modulação dos efeitos da decisão ou de regime de transição para a adoção da nova tese jurídica, como forma de proteção da confiança legítima e do interesse social.
Segundo ela, “quando essa superação é motivada pela mudança social, é recomendável que os efeitos sejam para o futuro apenas – isto é, prospectivos –, a fim de resguardar expectativas legítimas daqueles que confiaram no direito então reconhecido como obsoleto”.
Nancy Andrighi ressaltou, no entanto, que a modulação de efeitos, “deve ser utilizada com parcimônia, de forma excepcional e em hipóteses específicas, em que o entendimento superado tiver sido efetivamente capaz de gerar uma expectativa legítima de atuação nos jurisdicionados e, ainda, o exigir o interesse social envolvido”.
No caso em tela, a ministra considerou que “é inegável a ocorrência de traumática alteração de entendimento desta Corte Superior, o que não pode ocasionar prejuízos para a recorrente, cuja demanda já havia sido julgada procedente em primeiro grau de jurisdição de acordo com a jurisprudência anterior do STJ”.
A relatora concluiu que, se uma alteração legislativa posterior que mudasse a regulação dos seguros não poderia afetar a situação da recorrente, devido à irretroatividade das leis, “com mais razão não se poderia aplicar retroativamente – nos autos que já contavam com sentença favorável – o novo entendimento jurisprudencial”.
O voto da ministra foi acompanhado pelos ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro, restando vencido o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que votou pelo desprovimento do recurso especial.
Para acessar a íntegra do acórdão, clique aqui.
Fonte: STJ
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