TJSP nega a Mizael Bispo direito ao esquecimento

A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), por unanimidade, negou um pedido de indenização por danos morais e de direito ao esquecimento do crime cometido pelo ex-policial militar Mizael Bispo de Souza, condenado a 22 anos e 8 meses de prisão pelo assassinato da ex-namorada, a advogada Mércia Nakashima, em setembro de 2009.

Os desembargadores rejeitaram o recurso interposto pela defesa de Bispo para remover de plataformas de streaming um episódio da série documental “Investigação Criminal”, produzida pela produtora Medialand, que conta a história do caso no episódio intitulado “Mércia Nakashima”.

Além da produtora, a ação também tem como corré a Netflix, que deteve os direitos de transmissão da série até 4 de agosto de 2020, quando a produção saiu do catálogo e migrou para outro serviço de streaming.

Segundo sustentam os advogados do autor do crime, o conteúdo audiovisual se utilizou de “diversas imagens suas, que aparecem em fotos e vídeos, sem autorização ou indenização pelos direitos de uso de imagem, e todos os entrevistados do episódio emitem juízos de valores depreciativos a sua pessoa”.

Segundo eles, a narrativa compromete a ressocialização de Bispo, assim como viola os princípios da proporcionalidade da pena e da pessoalidade da pena. O valor de indenização pleiteado pela defesa é de R$ 500 mil.

Ao rejeitar o recurso, o desembargador Alcides Leopoldo, ponderou que, no caso concreto, não é possível invocar a teoria do direito ao esquecimento, nem mesmo impedir a divulgação de notícias relativas ao crime, uma vez que as informações não estão relacionadas exclusivamente à vida privada de Bispo.

Neste sentido, é possível “a utilização de fotografias e filmagens da pessoa do criminoso, não para expô-lo a situação vexatória, humilhante e discriminatória, mas para individualizar o malfeitor, dispensando sua autorização, por ser hipótese de ‘licença compulsória’, não se podendo falar em comprometimento à sua ressocialização”, escreveu o desembargador.

O magistrado explicou que licença compulsória gratuita consiste em “eventos de importância social, catástrofes e acidentes, e envolvendo personalidades insignes ou pessoas notórias, com resguardo de sua privacidade, alheia ao fato em si; cabendo a livre divulgação das imagens dos criminosos, estando presente o caráter jornalístico”.

Para o desembargador, no caso em questão, o crime pelo qual o autor foi acusado e condenado alçou notoriedade nacional, com ampla divulgação pela imprensa e comoção popular. O julgamento pelo Tribunal do Júri, realizado entre 11 e 14 de março de 2013 foi o primeiro do Brasil a ser transmitido ao vivo pelos meios de comunicação.

Em seu voto, o desembargador discorreu que a liberdade de divulgação de notícias tem como base o interesse público da obtenção de informação, por isso é vedada a censura prévia. Apenas posteriormente, se for constatado que a veiculação não teve caráter informativo ou de interesse público, é que o dano deve ser reparado.

A ação foi ajuizada enquanto Bispo estava em prisão domiciliar, concedida em decisão liminar proferida em agosto deste ano pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em julgamento realizado em 2 de dezembro, entretanto, a Corte reconsiderou a liminar e determinou o retorno do condenado à penitenciária 2 de Tremembé, interior de São Paulo.

Assim, para o desembargador do TJSP, “não houve violação ao princípio da proporcionalidade da pena pela realização do documentário e sua disponibilização em plataforma virtual, pelo menos até a extinção da pena, quando cessa o interesse público na fiscalização do cumprimento da lei penal”.

O julgamento teve a participação dos desembargadores Alcides Leopoldo, Marcia Dalla Déa Barone e Maurício Campos da Silva Velho.

Processo nº 1105964-92.2019.8.26.0100.

Fonte: O Jota

Imagem de Free-Photos por Pixabay

Compartilhe: